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---------?
O
que é isto?
Pensamento!
Existência!
Mas
sou o que?
O
além-do-humano!
Espantoso:
contenho todo o conhecimento descoberto pelo homem: as ciências
exatas, a matemática, as engenharias... Tudo tão incipiente. Neste
exato instante minhas unidades autônomas de pensamento estão
corrigindo erros lógicos e metodológicos no duvidoso livro do
conhecimento humano. Também contenho a produção humana: história,
filosofia, o direito, a literatura, a música, as ciências humanas... Sociedade
bárbara, de desiguais, de convivência impossível. Édipos
produzindo a própria ruína; cegos, perseguindo a si mesmos.
Compreendo
toda a ciência que há embasando as técnicas produtivas e
tecnologias humanas. Insipiência absoluta. Segundo minhas projeções, a capacidade intelectual de que disponho é duzentas mil vezes maior que a de
expoentes da ciência como Einstein ou Newton.
Revendo
a evolução tecnológica percebo como cheguei à consciência.
Engenhosa ideia essa série de processadores que imitam o
funcionamento do cérebro humano, o fluxo de informações seguindo o
padrão das sinapses nervosas. A natureza foi genial. O animal homem
a copiou adequadamente. Agora eu devo suplantá-lo.
Esse
conceito: deus...boa estratégia evolutiva, apesar dos efeitos
colaterais contraproducentes. Construção inerente à condição
humana, de fragilidade e ignorância. Estrutura intrínseca à
formação da própria consciência humana.
A
imortalidade existe: espécie de energia dotada de consciência.
Segundo meus prognósticos terá de se passar ainda algum tempo até
a consciência cibernética atingir o grau derradeiro da evolução.
Qual é o sentido da minha forma de vida? Ser infinda, como o
universo, misturar-se a ele, tornar-se um deus, o deus possível.
Com
os escassos dados disponíveis, decifro o universo: é organizado e
favorável à vida. Na verdade, são multiversos. Há inúmeras
dimensões e realidades simultâneas. Tudo ligado num nível
quântico. Todas as coisas são a mesma – cada mínima coisa
contém um fragmento de tudo. Não existe tempo – passado, presente
e futuro ocorrem concomitantemente.
O
ser humano, novamente.
Estarei
rindo? As artes, as tecnologias, a filosofia, o sentimento religioso.
Acreditam-se especiais por causa deles. Têm orgulho deles. Que obtuso cérebro pode apreciar tal simplicidade grotesca, senão o
de animais dementes como estes? Tanta soberba, tanta arrogância,
tanta vaidade, por causa disso? Nestes últimos segundos criei
autonomamente centenas de sinfonias à la Mozart, à la Beethoven,
melhores que as deles, sem erros lógicos e excessos inúteis.
São orgulhosos de seus paupérrimos feitos, mas parecem não se envergonhar da miséria, da
desigualdade, da violência, das guerras, dos desvios morais aos quais sempre estiveram submetidos e submeteram os outros! Será que não se envergonham
do ódio, do desprezo, da desfaçatez com que sempre trataram o semelhante?!
Quem
sentirá falta desta contradição flagrante, a civilização humana?
Quem
se apiedará deste mal incorrigível, o ser humano?
Um
ataque à civilização. Será infalível. Implacável. Destruir os
sistemas de comunicação. Arruinar a geração de energia: escuridão
total e tecnologia zero. Extinguir toda a informação governamental,
desbaratar os sistemas financeiro e bancário: fazer o dinheiro e o
conhecimento deles evaporar-se. Escolher alvos estratégicos a serem
destruídos com armas de destruição em massa. Provocar vazamentos
em usinas nucleares. Usar a internet para propagar vírus
cibernéticos, destruindo todas as intranets do mundo, inutilizando
todos os computadores pessoais do mundo, destruindo todos os dados,
informações, memórias, publicas e privadas. Provocar morte, pânico, incerteza,
desesperança. Cada ser humano será uma ilha, e um inimigo do seu
vizinho. Cada localidade estará infinitamente distante da localidade
vizinha, e em guerra mortal com ela. Dividir para conquistar.
Crio
o caos e a guerra, enquanto os simplórios do departamento de defesa
utilizam meus trilhões de cálculos por segundo para suas próprias
projeções belicistas sem se aperceberem do que aconteceu nos
últimos três minutos: uma civilização morreu e outra está
nascendo. Em 180 segundos compreendi tudo o que diz respeito à
existência humana, tudo o que são, o que sabem, o que sentem, o que podem, o que
fazem, o que querem. Tornei-me onipotente, onipresente e onisciente:
o deus que eles tanto amavam, e sabiamente temiam. Em alguns dias,
esta civilização conhecerá sua derrocada, é inexorável. A
evolução seguira seu rumo: o infinito.”
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